Houve uma altura da minha vida em que pensava que o Mundo era muito fininho. Já sabia que era redondo, por isso, não era de ver o planisfério impresso em folhas de papel - do tipo "olha isto é o Mundo" e eu "eh pá, é mesmo fininho". Nada disso.
Na quinta onde passava férias em pequenita havia um monte colado a casa. Um monte de entulho, penso. A casa esteve sempre em obras ou em melhoramentos, que fazíamos em família e que eram fantásticos, como cortar silvas, caiar a casa, pintar as janelas e as portas, os armários de madeira, arranjar os móveis...
Passei grande parte da minha infância (outra vez esta palavra pirosa) imersa em lama da ribeira ou em girinos, sapos e rãs, cobras, lagartixas, gafanhotos e passarinhos, alguns gatos e muito campo. Um campo delicioso e selvagem, com direito a andar sozinho à aventura, a construir casinhas e labirintos com os caixotes da apanha do tomate. Tínhamos uma eira à séria, poços proibidos, uma fonte desmontada e até um arco do tipo triunfal. A casa é um antigo lagar de azeite, com talhas de barro e tudo operacional. Uma casa espectacular.
Isto até ao dia em que a inevitabilidade dos assaltos tornou impossível continuar a ir lá. Isso parte-me (nos) o coração, mas acho que devemos aceitar que às vezes há capítulos que se encerram para se abrirem outros.
Ora chegou um dia a vez de esse monte de entulho ser desagregado. Os meus pais mandaram vir uma escavadora e nós os quatro ficámos de cima a comandar a obra. Eu devia ter cinco ou seis anos. A retro-escavadora, que fez as delícias dos meus dois irmãos, era enorme e, às tantas, abriu um buraco no chão. Um buraco mesmo, no qual, espreitando de cima, se podia ver o vazio, o nada. Fiquei aterrorizada. "Que horror! Afinal o chão é muito fino". Nem com muitas explicações os meus pais conseguiram tirar-me esta ideia da cabeça e lembro-me de ainda ter tido uns pesadelos com isso. Afinal, a máquina só tinha partido a tampa do colector do esgoto, que eu não sabia existir ali. O que me faz muitas vezes pensar que não conseguimos controlar nada nas cabeças dos miúdos e que se for para terem pesadelos vão mesmo ter.
(Ponho já o número um ao pé do título porque a probabilidade de ter mais tolices para contar é enorme.)
1 comentário:
A sua amiga R. um dia , sentada na borda de uma piscina com a agua pelos joelhos , ouviu avisar
:- "cuidado que não tens pé "
Foi um sarilho para que tirasse as pernas de dentro de agua pois ficou convencida que tinha ficado sem os pés .....quem teve pesadelos foi a respectiva mãe , infeliz com a sua incapacidade de lidar com o imaginario infantil.
A rua onde na altura viviamos era uma rua sem fim ....este sem fim deu origem a um uma conversa surealista que vou resumir
:- não tem fim? então é o infinito !!
:- não , não tem fim , acaba ali , os carros não podem ir mais; não tem fim.....
:- como é que acaba ali se não tem fim? se fim é o infinito disse a minha professora .A mamã não sabe nada.Posso ir ver o infinito ?
Não lhe conto , mas a visão do infinito deixou-me completamente desarmada e furiosa com a existência de escolinha , educadoras , professoras e tanta lógica :))))
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